segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

UM BRINDE AOS DIREITOS HUMANOS!

Ivan de Carvalho Junqueira*

Viva!

A semana que se inicia marca o aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Assembléia Geral das Nações Unidas através da resolução 217-A (III), a 10 de dezembro de 1948.
É dia de festa (ou, ao menos, deveria), afinal, há 60 anos inaugurou-se inovadora perspectiva no seio das sociedades, na medida em que, a partir dali, ao menos formalmente, todos foram tidos quão iguais perante a lei.
Saíamos de tão doloroso momento, 2.ª Guerra Mundial, pessoas, aliás, milhões delas, transformadas em sabonete, tratadas como mercadoria, exterminadas sob a égide da purificação de “raças”? (ora, só conheço uma: a humana), em meio a insanidade e barbárie nazi-fascista em que negros, judeus, comunistas e homossexuais, gente como a gente, acabaram desconsiderados, impassíveis de reconhecimento.
Como sabido, os direitos humanos são indivisíveis, irrenunciáveis, inalienáveis e imprescritíveis, eis alguns de seus caracteres.
Ao curso da história, inúmeros documentos, tratados e declarações, em âmbito pátrio e alienígena, o ratificaram. Da Magna Charta inglesa, do rei João Sem Terra, aos idos de 1215, à recentemente aprovada Declaração dos Povos Indígenas, de 2007.
Da DUDH, contudo, extraiu-se brilhante característica, aliado àquelas, qual seja: o universalismo, reafirmando, logo ao início que: “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação umas as outras com espírito de fraternidade”.
Não obstante contida há séculos, remontando a origem do homem (entendamos bem: mulheres e homens), culminou com verdadeira ruptura de paradigma. Neste diapasão, todos somos seres humanos (desculpe-me pela obviedade, embora necessária) fazendo jus, portanto, à plataforma emancipatória adstrita aos direitos humanos contemporâneos.
No que tange ao estudo dos direitos humanos, em âmbito doutrinário, dividem-nos alguns em gerações. Didaticamente, diz-se de 1.ª geração, os direitos civis e políticos (direito à vida, liberdade, propriedade); de 2.ª geração, os direitos sociais (direito ao trabalho); de 3.ª geração, os direitos difusos e coletivos (direito dos povos, solidariedade, paz, meio ambiente); de 4.ª geração, o direito à democracia, por exemplo. Há quem afirme os de 5.ª geração, a abarcar o direito ao sentimento.
Hoje, mais que um ou outro, tem-se uns e outros, sendo todos, indistintamente, por demais relevantes.
A despeito de toda luta e militância em favor dos direitos humanos, muito há que se fazer. Nada é tão simples. No Brasil e na América Latina sacrificaram-se milhares de vidas, à imposição de sucessivos governos militares, por conseguinte, totalitários. Colhemos os frutos disto, ainda.
Ao presente, conjuntamente à promoção e educação em direitos humanos, assistimos, quase que diariamente, a uma constância de violações. Daí a importância de jamais nos conformarmos, pois, se verdade é que muito caminhamos nesta seara ao decorrer de seis décadas, não caminhamos, porém, o bastante.
Neste momento, inimaginável seria não (re)lembrar alguns episódios, apenas os mais recentes no país: Tikuna (1988), Carandiru (1992), Candelária (1993), Vigário Geral (1993), Yanomamis (1993), Corumbiara (1995), Eldorado dos Carajás (1996)...
Em Robin Island, trancafiaram Nelson Mandela nada menos que 27 anos. Por que?
Violências de toda ordem, não raro, também contra pessoas: Martin Luther King, Wladimir Herzog, Chico Mendes, Dorothy Stang...
Direitos humanos para humanos direitos? Quem já não escutou...
Assistimos, comumente, significativa parcela da população a clamar por mais e mais punição... como num passe de mágica crêem alguns, seduzidos por certos discursos encampados por alguns meios de comunicação que, em se adotando, por suposto, prisões perpétuas quando não capitais e, uma vez reduzida a idade de responsabilização penal para, quem sabe, 16, 15, 14, 13 anos... tudo se resolverá. Será?
“Direitos dos manos”, mais uma dentre tantas outras expressões, extraídas do imaginário coletivo... Difundida, acaba por contribuir, unicamente, em face dos direitos humanos, à sua triste (des)construção cujos reflexos, inclusive, irão de encontro àqueles que o profanaram.
A contrario sensu, falar em direitos humanos é compartilhar o melhor de cada qual de nós, à essência, numa sociedade que – ainda – se pretende justa, fraterna e solidária, alheia a distinções de qualquer natureza.
É acreditar no potencial e no infinito leque de possibilidades, ainda não descobertas, inerente a cada indivíduo, por si ou em comunidade.
Somos hoje, neste planeta que se denomina Terra, cerca de seis bilhões de seres humanos. Mas, para muitos, não há chão nesta terra. Quase invisíveis ao olhar de todos. Ao nosso redor, milhões passam fome, sem teto para morar, sem água para tomar, sem vida (digna) para viver... numa deletéria conjuntura em que, quase sempre, riqueza mercantil sobrepõe-se à humana, onde mais vale o Ter que o Ser.
É também lutar para melhorar o outro, todavia, com o outro e, não, pelo outro.
Sinteticamente, vivenciar os Direitos Humanos, 60 anos depois, é:
Combater nossos preconceitos e discriminações, assegurando a totalidade de direitos do ser que, embora já concebido, ainda está por vir, ao mais idoso;
Lutar, dia a dia, pelo efetivo reconhecimento da igualdade, sem distinção de cor, sexo, credo, idade, opção sexual, afinidade política, filosófica e/ou partidária;
Assegurar a cada pessoa amplo acesso à educação, saúde, trabalho e lazer, para ela e a cada qual dos membros de sua família;
Garantir plena liberdade de expressão e opinião;
Efetivar a todos, irrestrito direito à defesa, pois, somos inocentes até prova em contrário;
Avançar na luta contra a AIDS e pela sustentabilidade ambiental.
É, finalmente...
Reconhecer em cada adolescente e, muito especialmente, no adolescente por nós acolhido, um sujeito de direito, protagonista de sua própria história, sem rótulos nem números, à personalização e humanização de nosso atendimento.
É, em suma, ser idealista.
Parafraseando Hannah Arendt: “A essência dos direitos humanos é o direito a ter direitos”.
Um brinde aos DIREITOS HUMANOS!

* Bacharel em Direito, educador na Fundação CASA/SP e autor dos seguintes livros: “Dos direitos humanos do preso”, “ABC dos direitos humanos” e “Do ato infracional à luz dos direitos humanos”.

sábado, 20 de dezembro de 2008

2009

Bem, chegou o Natal e com isso o fim do ano... Sempre detestei esses dias, calor, consumismo... e uma sensação de ter deixado algo na estrada... Penso em 2008, há um poema do Mário que se chama "Esperança" e, quem sabe possa traduzir o que eu quera falar nesse momento, se tu não sabes de qual o poeme estou falando... procure.... o google te ajuda, ele faz o serviço sujo por ti...
Corri muito em 2008, deixei cafés, chás.... peço desculpa as pessoas que me esperaram em vão... Aos convites que não respondi, as pessoas que não pude conhecer... Aos amigos abandonados... A vida, aos bons momentos que deixei de viver... Quero deixar o tempo pra lá... deixar o relógio em 2008... E, em 2009 ter calma... tomar um café com uma pessoa maravilhosa... ter uma boa conversa sobre qualquer assunto... E, caminhar sem destino... Ver o que acontece ao meu lado... Prestar mais atenção...
Eu sei, sou um sonhador, mas fazer o que...
Feliz 2009!

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

CARTA EM DEFESA DA DEMOCRACIA NO MARANHÃO

A Via Campesina Brasil, composta pelos movimentos sociais do campo, pastorais e entidades – MAB, MPA, MMC, MST, PJR, CPT, CIMI, FEAB e ABEEF – vem expressar sua posição e denunciar à sociedade brasileira, a ação traiçoeira que a oligarquia Sarney tenta impor ao povo do Maranhão.

O Maranhão é um dos lugares do mundo que mais concentra terra. E isso é fruto da política latifundista e concentradora desenvolvida há mais de 40 anos por esta oligarquia e em 2006, o povo maranhense, em eleição democrática e popular, escolheu Jackson Lago, governador do Maranhão, e derrotou assim, a mais atrasada e cruel oligarquia do país, a família Sarney.

Por isso, repudiamos os atos que a oligarquia Sarney vem fazendo para tentar reverter sua derrota nas eleições de 2006 e no pleito de 2008. E denunciamos para a sociedade brasileira a ação traiçoeira que esta oligarquia tenta impor ao povo maranhense. É preciso saber que há quase dois anos está em curso a montagem de um golpe, que tenta cassar na justiça o mandato popular do Jackson Lago, para entregá-la à Roseana Sarney, a filha do velho oligarca.

Além da petulância de por várias vezes marcar a data de cassação de Jackson, espalha que ainda este ano o governador será cassado pelo TSE. Reiteramos aqui, nossa crença no dever de isenção do TSE enquanto gestor dos processos eleitorais que garantem à sociedade a plena manifestação de sua vontade, pelo exercício do direito de votar e ser votado.

Repudiamos, assim, todas as ações realizadas nos municípios nos quais os representantes da oligarquia tentam, através de ações judiciais, impedir a posse de prefeitos eleitos por partidos contrários à oligarquia.
Nós da Via Campesina Brasil somos solidários ao povo maranhense e ao governador Jackson Lago, assim como apoiamos as mobilizações populares em defesa de suas escolhas e conquistas.

NÃO AO GOLPE. VIVA A DEMOCRACIA NO MARANHÃO!

Fonte: www.carosamigos.com.br

terça-feira, 4 de novembro de 2008

O Lula americano

Além de ouvir o hino americano com as mãos sobre a bolsa escrotal e não sobre o coração, Barack Hussein Obama adulterou o emblema das armas nacionais para fazer dele um logotipo de sua propaganda eleitoral, declarou que a bandeira americana "é um símbolo de violência" e, para completar, tirou as cores do país do leme do seu avião de campanha, substituindo-as pelo "O" que representa... ele próprio. Mais que simples desprezo, essas atitudes denotam um esforço consciente de destruição dos símbolos nacionais. Esse esforço, por sua vez, não precisa de interpretação simbólica: seu sentido é auto-evidente. Ele dá expressão eleitoral à guerra cultural travada contra os EUA, de dentro e de fora do país, desde os anos 60: trata-se de erigir, sobre os escombros do patriotismo e da soberania, um novo sistema de lealdades, baseado na aliança de todos os ódios anti-americanos, anti-ocidentais e anticristãos com os interesses bilionários empenhados na implantação do governo mundial. O sinal mais claro dessa aliança são as fontes de apoio financeiro do candidato: de um lado, grupos radicais e pró-terroristas, de outro as megafortunas globalistas e a grande mídia em peso. Daí o vigor da sua campanha, que tem quatro vezes mais dinheiro que a do oponente e – sem exagero – vinte ou trinta vezes mais cobertura jornalística.Com esse respaldo, ele se permite desafiar não só todas as conveniências, mas passar por cima das exigências legais mais elementares: depois de sonegar durante meses sua certidão de nascimento, apresentou uma certidão manifestamente falsa (Click AQUI para ver em inglês). O documento original, que continua sumido, é necessário para tirar a limpo uma questão essencial: Obama é cidadão americano ou é um estrangeiro, inelegível portanto? A ocultação e a fraude subseqüente falam em favor da última hipótese, mas o entusiasmo inalterado dos obamistas, contrastando com o seu absoluto desinteresse em esclarecer essa questão, mostra que preferem antes demolir de um só golpe o sistema eleitoral americano do que permitir que os republicanos continuem no poder: o novo sistema de lealdades já está em vigor, sobrepondo à integridade nacional as ambições partidárias da esquerda.Com a mesma insolência autoconfiante, os planos de governo de Obama contrariam flagrantemente a vontade da maioria, sem precisar temer que isso tire um voto sequer do candidato. A nação quer baixar o preço da gasolina; Obama promete aumentá-lo, mantendo o veto à abertura de novos poços de petróleo. A América quer ver os imigrantes ilegais pelas costas; Obama promete não somente anistiá-los, mas dar-lhes assistência médica com o dinheiro dos contribuintes. A nação quer menos impostos; Obama promete criar mais alguns. Se milhões de cidadãos americanos que pensam e querem o contrário de Obama juram votar nele para presidente, não é por causa do que ele promete, mas a despeito de ele lhes prometer até mesmo o inferno. A atração da imagem hipnótica é mais forte do que o cálculo de custo-benefício.A campanha de Obama é uma obra de engenharia psicológica de precisão, planejada não para conquistar os eleitores pela persuasão racional, mas para debilitá-los, chocá-los e estupidificá-los ao ponto de fazê-los aceitar todo prejuízo, toda humilhação, toda derrota, só para não contrariar a suposta obrigação moral de elegê-lo, pouco importando que ele seja mesmo um inimigo disfarçado. Sacrificar tudo ante um fetiche, e fazê-lo até certo ponto conscientemente, compartilhando portanto as culpas da operação e incapacitando-se previamente para lutar contra ela depois de realizada, eis o que Obama está exigindo – e obtendo – dos eleitores.Já vimos essa operação ser realizada no Brasil, com base na imagem estereotipada do "presidente operário", contra cujos crimes e perfídias já ninguém pode levantar uma voz audível, pois, arrastados pela chantagem psicológica, todos se acumpliciaram de algum modo ao ritual de sacrifício ante o altar do ídolo.

Olavo Luís Pimentel de Carvalho nasceu em Campinas, SP em 29/04/1947 é escritor, jornalista, palestrante, filósofo, livre pensador e intelectual, tem sido saudado pela crítica como um dos mais originais e audaciosos pensadores brasileiros, publica regularmente seus artigos no jornal "Diário do Comércio" e no site "Mídia Sem Máscara", além de inúmeros outros veículos do Brasil e do exterior. Já escreveu vários livros e ensaios, sendo que o mais discutido é "O Imbecil Coletivo: Atualidades Inculturais Brasileiras" de 1996, que granjeou para o autor um bom número de desafetos nos meios intelectuais brasileiro, mas também uma multidão de leitores devotos, que esgotaram em três semanas a primeira edição da obra, e em quatro dias a segunda. Atualmente reside em Richmond-Virginia, EUA onde mantém um site em português e inglês, sobre sua vida, obras e idéias.E-mail: olavo@olavodecarvalho.org Publicado no "Jornal do Brasil".Quinta-feira,24 de julho de 2008.

sábado, 13 de setembro de 2008

Pensamentos soltos

Hoje é um sábado frio nesse lugar, carros anunciam lixo eleitoral, acabei de ler um livro da Clarice! Enquanto escrevo isso tomo um café!
A questão que me vem a mente é para quem escrevo ou para que? Não quero ser linear ou tecer um texto lógico, hoje quero o caos, a beleza de dar um passo rumo ao desconhecido. Procurar por aquele pensamento que escondemos de todos, mas que nos aparece nas madrugadas sem sono.
Pela manha caminhei um pouco tentando me encontrar, é estranho passar por lugares, por pessoas que tu não ve a tanto tempo, é triste ver que eles continuam ali, como uma tela, esperando por algo que não sei o que é?
O que espero do futuro?
O futuro é o segundo seguinte, o agora já vai ser passado.
Tenho pensado muito na morte, estou criando uma teoria de que a morte é a sublimação da vida, é a vida ao quadrado. Qual a verdade sobre a morte, não sei, mas quero saber. Procuro respostas, não pra ter saber, mas pra ter o tormento da verdade, será que vou suportar?
Quero viajar, ficar uns dias foras daqui, vou até Santa Catarina, ficar longe, longe... Longe do que? Não sei.
Até!

domingo, 3 de agosto de 2008

Agosto

Agosto está ai... Hoje conversando nas esquinas das vidas percebi que estamos indo pra reta final de 2008, e o que construimos? Vivemos de forma plena ou deixamos a nossa vida no automatico?
A vida está num ritmo corrido por demais, não temos mais tempo pra amar, pra nada... É trabalho, trabalho!!! Fico afastado das pessoas que amo por compromissos que tenho, e isso leva um tempo precioso.... Com pessoas falsas, maquiavelicas... Mas sei que mesmo que eu me tenha meus momentos de ceticismo, tenho que continuar, pra ficar vivo e tentar fazer a diferença!
Por isso esse post é um apelo, apelo pro meu "eu" também, para nos libertarmos, vivermos... Temos que ser livres, pelo menos por um dia... Viver plenamente! Amar!
Anunciar o amor que temos aos quatros cantos, declarar nossos desejos, ajudar ao próximo, lutar e lutar!
Vamos lá!

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Semana

A semana está acabando, o que fiz? Vivi, mas venci?!
Prego, aceitei novos desafios, sei que vai ser complicado mas vamos a luta! Tantos projetos... Educação Popular, Teatro, Hip Hop, estou apostando alto, e vamos ganhar, vamos levantar a UESC! É um baita desafio, mas somos três camaradas, unidos, sem medo de lutar... E, em breve estaremos entre cinco companheiros, a vitória é nossa!
E, hoje percebi que estou voltando a amar novamente... Sem neuroses, sem DRs. Simples estou me sentindo mais vivo, e tu és parte desse processo que me encontro, desta paz que tenho no coração, paz inquietante, paz de revolução.
Bueno é isso, to contente com os projetos da UESC, to feliz de te ter ao meu lado, tu me dá força pra seguir, pra continuar... És importente pra mim, já faz parte da minha vida, estou te amando!
A semana foi produtiva, foi sim!

"Amar é dar ao outro tudo de si. Até mesmo a própria solidão, coisa mais última que se pode dar." C. L.

segunda-feira, 21 de julho de 2008


Maio de 68: a última onda revolucionária que atingiu o centro do capitalismoValério Arcary, professor do CEFET/SP, doutor em história pela USP e autor, entre outros livros, de As Esquinas Perigosas da História, é militante do PSTU
Baixe a íntegra deste artigoSe não houvesse senão uma chance sobre cem mil, uma ínfima probabilidade, eu apostaria mesmo assim (...) Eu tenho a paixão das causas difíceis, quase perdidas, quase desesperadas. É toda a diferença entre a falésia, confortavelmente sentada, contente de seu lugar, arrogante, condescendente consigo mesma, e a onda, que reflue, se retira, sem esquecer jamais de voltar à carga. Tu sabes quem, entre a falésia e a onda do mar, tem a última palavra?Daniel Bensaïd [1]
Só há bons ventos para quem sabe onde quer chegar.Sabedoria popular portuguesa
Melhor andar para trás, do que andar para frente na direção errada.Sabedoria popular inglesa
Essa é uma briga particular, ou qualquer um pode participar?Sabedoria popular irlandesa O maio de 1968 francês é um daqueles meses que fizeram história. Quarenta anos são um intervalo de tempo suficiente para podermos olhar o passado com sentido de perspectiva. Todos os anos têm doze meses, todos os dias têm vinte e quatro horas, mas os dias, os meses e os anos não são iguais entre si. Há horas que valem por meses, dias que valem por anos, e meses que valem por décadas, pela intensidade dos acontecimentos e suas conseqüências. Quando revoluções se colocam em movimento, a história se acelera, e tudo que parecia duvidoso se torna, subitamente, plausível. Revoluções aconteceram, estão acontecendo e voltarão a acontecer porque mudanças eram, são e continuarão sendo necessárias. As forças de inércia das sociedades contemporâneas, contudo, foram, são e permanecerão sendo muito grandes, bloqueando até as transformações pela via de reformas. Foi o reacionarismo das classes dirigentes que, invariavelmente, emperrou as reformas e empurrou as massas na direção da revolução. As revoluções em um país, todavia, sobretudo se vitoriosas, favorecem mudanças por reformas. Nos países onde o terremoto explodiu, e em outros. Mesmo as revoluções abortadas funcionam, historicamente, como um "alerta amarelo" para as classes dirigentes de que algumas concessões terão que ser aceleradas, para evitar um novo curto-circuito das relações político-sociais (Draper,1978). As reformas podem ser econômicas, sociais, políticas ou culturais. A extensão do direito de organização sindical, ou a universalização do voto nas décadas finais do século XIX, na França, mas também na Alemanha, por exemplo, seria inexplicável sem a Comuna de Paris de 1871. A consagração do salário mínimo, ou as preocupações keynesianas com o desemprego seriam incompreensíveis sem a revolução de Outubro de 1917, e o perigo de novos Outubros. Separar o que foi a obra da revolução, do que foi a política da contra-revolução, é um dos desafios mais importantes da historiografia.O maio francês foi uma revolução política e, mesmo derrotada, abriu o caminho para reformas, entre elas, mudanças sócio-culturais progressivas que eram inadiáveis. Os direitos da mulher passaram a ser parte da agenda política: o direito ao divórcio, a legalização do aborto, a criminalização da violência doméstica, entre outros, encontraram reconhecimento legal, mais rápido ou mais lentamente, em inúmeros países. Os direitos da juventude, entre outros, foram, também, ampliados. Não deveria surpreender que muitos tenham se dedicado, nas décadas seguintes, a exorcizar o fantasma, ou o perigo, da revolução social anti-capitalista, aplaudindo as reformas político-culturais. Mas, as reformas não foram obra da contra-revolução: foram, essencialmente, um sub-produto da revolução.O maio francês se desenvolveu, também, no contexto de uma vaga revolucionária internacional, a maior da segunda metade do século XX antes dos processos do Leste Europeu entre 1989-91, que fez tremer a ordem mundial: nas ruas de Saigon se revelava para o mundo que o Império mais poderoso da história, militarmente, não poderia alcançar uma vitória no Vietnam; de Paris ao Rio de Janeiro, de Praga à Cidade do México, de Turim a Córdoba na Argentina, sem esquecer a nova situação dentro dos EUA e na Alemanha - só o Japão, na Tríade, escapou - e as batalhas decisivas das guerras de libertação nacional contra o Império Português na Guiné, Angola e Moçambique, em quatro continentes, a revolução abria frentes de combate.Revoluções são surpresas históricasRevoluções foram sempre uma surpresa histórica. Mas, na história, há surpresas e surpresas. Marx tinha acompanhado o movimento operário francês, com especial atenção, embora a influência dos proudonistas, nas alas mais moderadas, e dos blanquistas, entre as radicais, fosse superior à dos seus camaradas. Paris foi, afinal, a capital da revolução européia no século XIX por três vezes: em 1830, 1848 e 1871. Ao final da vida, Marx depositou esperanças em uma revolução que viria da Rússia, um dos últimos grandes Impérios autocráticos.A república que surgiu da derrota da Comuna de Paris parecia ter consolidado o poder burguês por muitas gerações, e afastado a França do furacão revolucionário. Ao final da Primeira Guerra Mundial, a França, uma das potências vitoriosas, embora exausta, senão prostrada pelo esforço de guerra, foi poupada da onda revolucionária que sacudiu a Europa central e oriental. Na seqüência da crise mundial de 1929, a França chegou a viver a experiência de um governo de Frente Popular com Leon Blum, eleito em 1936, e uma situação revolucionária com a grande greve geral, mas as hesitações insuperáveis da SFIO (Seção Francesa da Internacional Operária) - a social-democracia - e do PCF (Partido Comunista Francês), associadas às dificuldades no cenário internacional - consolidação do nazismo na Alemanha, terror do estalinismo na URSS durante os anos dos julgamentos de Moscou, isolamento das forças revolucionárias na guerra civil espanhola - conduziram a uma inversão desfavorável da relação de forças entre as classes. As classes proprietárias francesas abraçaram uma perspectiva contra-revolucionária aberta: "mieux Hitler que le Front Populaire" (melhor Hitler que a Frente Popular).Depois do fim da Segunda Guerra Mundial, no entanto, não voltaram a se abrir situações revolucionárias nos países centrais, e a burguesia européia e seus representantes estavam confiantes que as revoluções eram turbulências do passado, características de uma época histórica superada, ou de países atrasados ou até exóticos, como Cuba. Mesmo entre os marxistas eram poucos aqueles que ainda apostavam nos desdobramentos de uma situação revolucionária nas metrópoles imperialistas, apesar das conseqüências desestabilizadoras das derrotas nas guerras coloniais, como no Vietnam e Argélia para a França. Empolgante e inesperado, o Maio de 68 francês demonstrou que revoluções ainda eram possíveis nas fortalezas da retaguarda do imperialismo contemporâneo.O grande tabu do pós-guerra: a presença dos PCs em governos europeusNa França, uma nova geração tinha chegado à vida adulta sem passar pela tragédia das guerras mundiais da primeira metade do século, mesmo se considerado os sacrifícios da juventude francesa nas guerras do Vietnam e da Argélia; o crescimento econômico, mesmo se financiado pelos investimentos norte-americanos - que deixavam a França e, de resto, toda a Europa, em uma posição complementar dentro do sistema internacional de Estados - era alimentado pelo peso da intervenção do Estado que aumentava os gastos militares: o capitalismo regulado não só tinha reduzido as taxas de desemprego, como se apoiava em uma crescente dependência de mão de obra emigrante; a extensão dos serviços públicos, mesmo se respeitadas as diferenças sociais consideráveis que ainda separava o padrão de vida dos trabalhadores das classes médias urbanas e rurais, tinha diminuído de forma significativa a mortalidade infantil, elevado a escolaridade e aumentado a proteção social dos idosos. Um otimismo histórico animava a sociedade, mesmo se considerado o perigo latente da guerra fria: os salários subiam lentamente, mas subiam, enquanto as pressões inflacionárias estavam sob controle; as necessidades mais intensamente sentidas - alimentação, moradia, transporte, educação, saúde - eram crescentemente satisfeitas; o consumo dos bens duráveis aumentava. Políticas keynesianas anticíclicas pareciam ter garantido a governabilidade política (Chesnais, 1997).Mas, estas mudanças não foram suficientes para conter os estudantes - a primeira linha da nova geração - e não impediram que estes arrastassem atrás de si a maioria do povo: entre 14 e 27 de maio, a França foi sacudida por uma greve geral espontânea, porém, irresistível, talvez uma das greves gerais mais fortes da história e que se alastrou de norte a sul, paralisando o país. À sua frente estava a juventude operária que, rapidamente, forjou uma aliança com os estudantes. Não restou a De Gaulle alternativa senão convocar o Exército, e apelar, dramaticamente, ao medo da revolução: ameaçou a nação com o perigo da guerra civil, algo impensável somente um mês antes. Sabia que a chantagem é uma arma política poderosíssima. Contava com a hesitação do PCF e a obteve, como concluiu o insuspeito Hobsbawm: "o PCF condenou-se a si mesmo durante os dias cruciais de 27 a 29 de maio, esperando e lançando apelos. Mas, em tais ocasiões, a espera é fatal. Os que perdem a iniciativa perdem o jogo" (Hobsbawm, 1999) [2].De Gaulle era consciente de que estava em jogo não somente o seu destino, mas um dos pilares da ordem do pós-guerra. Era preciso agir, e agir rapidamente para recuperar a governabilidade. Na França, ao contrário da Inglaterra, da Alemanha ou dos países nórdicos, onde a oposição - por dentro dos limites do regime político - se estruturava em torno de partidos social-democratas, a alternância eleitoral se expressava através da Frente Popular que tinha no PCF (Partido Comunista Francês) de George Marchais sua coluna vertebral. A presença de um partido comunista em um governo da NATO era ainda um tabu político. A proibição da presença dos PCs em governos na Europa ocidental era uma herança política das negociações entre Washington e Moscou ao final da guerra. Foi um dos artigos "pétreos" dos acordos de Yalta e Potsdam (Anderson, 1976). Só foi violado, depois do 25 de Abril de 1974, em Portugal.A influência alcançada pelo PCF na luta contra a ocupação alemã, assim como o prestígio da URSS pelos sacrifícios gigantescos do exército vermelho na luta contra o nazi-fascismo, tinham transformado o PCF no principal partido de oposição e, portanto, no principal beneficiado, se De Gaulle viesse a ser derrubado. Mitterand tinha reorganizado a SFIO em um novo partido socialista, mas estava longe, em 1968, de ter uma posição hegemônica na oposição ao gaullismo. O PCF, ao contrário de Tito na Yugoslávia, tinha colaborado na estabilização do regime entre 1945 e 48 - Maurice Thorez foi ministro de De Gaulle - e, nos seus planos, em 1968, não constava qualquer veleidade de desafiar Moscou.O PCF, todavia, não queria chegar ao poder antes da hora. Não queria uma revolução contra De Gaulle. Articulava, pacientemente, uma aliança eleitoral e aguardava. A direção do PCF sabia que revoluções não podem triunfar, se não estão dispostas a fazer a insurreição. Mas, insurreições precisam de uma direção. Esta foi umas das chaves de explicação para a posição attentiste ou de inércia (esperar para ver) do PCF e, portanto, pela sua falta de iniciativa em momentos decisivos dos combates de maio, e pela colaboração dos líderes sindicais da CGT, ao assinar e defender os acordos ao final da greve geral. O PCF estava disposto a chegar ao poder por eleições, nos marcos de um governo de colaboração de classes com aliados que tranqüilizassem a burguesia, mas não como resultado de uma revolução.No Maio de 1968 francês, abriu-se uma situação revolucionária atípica, porque sem uma direção disposta a lutar até o fim para derrubar o governo, portanto, diferente das situações revolucionárias clássicas, como aquela que precedeu a revolução de Outubro da Rússia de 1917 - quando havia um partido disposto a tomar o poder, o bolchevismo - mas ainda assim uma situação revolucionária: o governo De Gaulle tremeu e quase caiu. Foi mais parecida com a situação revolucionária que precedeu a revolução de Fevereiro de 1917 na Rússia, embora esta tenha sido vitoriosa: de um lado, uma colossal irrupção da mobilização operária, popular e juvenil, em grande medida espontânea e, do outro lado, por algumas semanas, a divisão da classe dominante - rachada entre os que defendiam o uso da repressão e os que hesitavam - e a paralisia do Governo e das instituições do Estado e, entre estas duas forças, um deslocamento à esquerda da maioria das classes médias, elas, também, cindidas, entre os pequenos proprietários mais reacionários, e as novas camadas intermediárias com alta escolaridade, porém, assalariadas.Um movimento estudantil admirávelUm novo movimento estudantil saiu às ruas em 1968 e, surpreendentemente, suas bandeiras eram vermelhas. Quando a repressão mostrou a verdadeira cara do governo De Gaulle - e, sem máscara, o que se viu foi estarrecedor - os estudantes foram para as portas das fábricas pedir o apoio do proletariado. Empolgaram a França e deixaram o mundo estupefato. Incendiaram o ânimo da maioria popular com sua imaginação política. Subverteram Paris. Os muros da cidade, que foi a capital cultural da civilização burguesa, foram cobertos com pichações, ao mesmo tempo, irreverentes e rebeldes, satíricos e amotinados como: "as mercadorias são o ópio do povo, a revolução o êxtase da história"; "Sejam realistas, exijam o impossível!" (Soyez réalistes, demandez l'impossible!); "Deixemos o medo do vermelho aos animais com cornos!" (Laissonz la peur du rouge aux bêtes à cornes!) "Corra camarada, o velho mundo está atrás de ti!" (Cours camarade, le vieuz monde est derriére toi!); "Os muros têm orelhas, vossa orelhas têm muros!" (Les murs ont des oreilles, vos oreilles ont des murs!); "O respeito se perde, não vão procurá-lo!" (Le respect se perd, n'allez pas le rechercher!).A entrada em cena dos estudantes foi um fenômeno histórico-social inesperado. Como sempre, diante de acontecimentos novos, aqueles que não permitem analogias, há o perigo de exagerar ou diminuir seu significado. Ambos os excessos foram cometidos para exaltar ou criticar o movimento estudantil que, repentino, surgiu à luz do dia. Antes de 68, o movimento estudantil nunca jogou um papel tão destacado em qualquer outro processo revolucionário. Entre outras razões, porque nunca antes tinham existido tantos estudantes, em especial, tantos estudantes com uma origem social não-burguesa. Sessenta e oito foi um batismo de fogo internacional: na França e no Brasil, no México e na Argentina, e mesmo em Praga, os estudantes estiveram na primeira linha. As transformações nas sociedades do pós-guerra - entre elas, a "explosão" demográfica, e a mais intensa urbanização e industrialização, mesmo de nações que eram capitalistas há séculos - exigiram uma mão-de-obra mais educada e alargaram o acesso ao ensino médio e ao ensino superior em uma escala qualitativa. O fenômeno geracional e social-cultural foi internacional, ainda que em proporções diferentes. Os jovens eram muito mais numerosos que no passado, e a entrada no mercado de trabalho passou a ser feita muito mais tarde.Não só o número, mas, também, o peso social dos estudantes aumentou com o agigantamento das cidades universitárias: a audiência das classes médias às reivindicações estudantis aumentou e a repercussão do exemplo de suas lutas entre o povo, incluindo o proletariado, também. Em Paris, a solidariedade com os estudantes, depois do cerco da Sorbonne, foi espantosa. Entre o 3 e o 11 de maio, o entusiasmo entre os estudantes não pareceu de crescer e contagiou a nação. Nem De Gaulle, nem a ditadura brasileira sabiam como lidar com aquela massa de jovens: imaginavam, com razão que, se reprimissem, podiam acender o pavio de uma mobilização incontrolável; se não reprimissem, poderiam sinalizar fraqueza, e se desmoralizar diante de sua própria base social. O dia em que a Sorbonne foi vermelhaOs primeiros atos de grandes dramas históricos parecem, freqüentemente, triviais. A luta de classes na Europa assumia uma forma previsível, e mesmo na França, depois do fim da guerra da Argélia, seguia um ritmo contido: lutas, essencialmente, defensivas, e protestos de dimensões modestas, que reagrupavam uma vanguarda. Mas, algumas prisões depois de um ato em solidariedade com a resistência no Vietnam foram o estopim de uma avalanche. Na seqüência, pouco mais do que uma centena de estudantes da Universidade de Paris-X, em Nanterre, na periferia de Paris, ocupou a sala do Conselho de Universidade [3]. O movimento estudantil estava engajado em uma campanha contra a reforma do ensino superior. Mas, não eram indiferentes à espetacular repercussão da Ofensiva do Tet que conseguiu hastear a bandeira vietcong no teto da embaixada americana em Saigon.A ocupação se estendeu para a Sorbonne, e o reacionarismo e a soberba do governo De Gaulle - uma mistura sempre explosiva - o levou a cometer a provocação de lançar a polícia sobre o Quartier Latin (o bairro latino de Paris, no coração da capital). Não conseguiram, apesar de uma apocalíptica batalha campal, desalojar a massa de estudantes que se defendiam em improvisadas barricadas. O espírito das jornadas revolucionárias de 1848 e de 1871 parecia ter ressuscitado. Poucos dias depois, um milhão de pessoas desfilaram pelas ruas de Paris em solidariedade com os estudantes e contra o governo. Foi um terremoto político, que anunciava que um tsunami estava por chegar: na seqüência, o país entrou em greve geral por tempo indeterminado, portanto, greve geral política, porém acéfala, sem uma proposta de saída política para a crise. O movimento não levantava sequer uma proposta clara de deposição do governo. Um fenômeno novo na Europa do pós-guerra: uma greve geral política apesar das direções dos sindicatos e contra as direções do PS e do PCF, ou seja, um processo, essencialmente, espontâneo, de rebelião operária-popular. Foi argumentado à exaustão que as massas não queriam fazer na Paris de 1968, uma Petrogrado de 1917. No maio francês, como de resto em todos os processos revolucionários da história, as massas não se lançaram à luta com um plano pré-concebido de como gostariam que a sociedade deveria ser. Os estudantes e operários franceses sabiam, porém, que queriam derrubar De Gaulle. Derrubar o governo é o ato central de toda revolução moderna. Quando descobriram a sua força social e política, no calor dos dias da greve geral, as massas populares francesas se moveram com instinto de poder. Seus dirigentes reconhecidos - porque a ação das massas em processos revolucionários está, geralmente, à frente ou à esquerda da sua consciência - ao contrário, esquivaram-se de responder à questão do poder. O desbordamento na ação dos aparelhos sindicais e políticos foi transitório. A crise política, que caminhava para se radicalizar em crise revolucionária, foi superada. O PCF não fracassou como partido revolucionário, mas como partido reformista (Touraine, 1969) . De Gaulle não caiu, imediatamente, mas, o regime tremeu. O mal estar foi desviado para os processos eleitorais que culminaram, mais de uma década depois, com a eleição de Mitterand, somente em 1981. Uma vaga revolucionária mundialO maio Francês esteve inserido na quarta onda da revolução mundial do século XX: a primeira teve como epicentro a revolução russa e se estendeu da Europa Oriental para a Central; a segunda sacudiu a Europa do Mediterrâneo depois da crise de 1929; e a terceira aconteceu na seqüência da derrota do nazi-fascismo. Entre 1968 e 1979/80 a dominação imperialista esteve seriamente ameaçada. Foi a mais internacional de todas as vagas revolucionárias, até hoje. O internacionalismo renasceu das cinzas com a solidariedade internacional ao Vietnam - uma campanha muito mais ampla que o apoio ao FLN (Frente de Libertação Nacional) na Argélia - e o repúdio mundial ao golpe de Pinochet. A quarta onda da revolução mundial começou na Europa, como as anteriores - maio 68 francês, primavera de Praga e Outono quente italiano -, mas, esteve articulada com a situação na Ásia (ofensiva no Vietnam e internacionalização no Camboja) passou pela África - início da derrota militar portuguesa nas colônias africanas, em especial na Guiné - e chegou a ter uma refração na América Latina, onde o movimento estudantil se levantou pelas liberdades democráticas (México e Brasil em 1968), e o movimento operário se lançou a ações de massas radicalizadas (Cordobazo argentino em 1969, revolução chilena 1970/73). Em todos estes processos, o papel dos partidos comunistas disciplinados por Moscou foi, dramaticamente, em maior ou menor medida, reacionário, e sua influência começou a declinar, abrindo o caminho para a reorganização de uma nova esquerda. A disputa da memória: a revolução foi possível?O maio francês foi satanizado pelas forças reacionárias do mundo inteiro, e transformado em polêmica eleitoral por Sarközy, porque foi a primeira vez que, em um país central da ordem imperialista, depois do fim da guerra em 1945, milhões se interrogaram outra vez se uma revolução social não seria possível. Essa foi sua herança mais significativa. Essa é a memória que os defensores da ordem estão preocupados em apagar.O maio francês será recordado, por alguns, porque ele ajudou a abrir o caminho para que surgissem, nos anos seguintes, os movimentos feministas, os movimentos negros, ambientalistas, os movimentos pela legalização das drogas, os movimentos contra a opressão homofóbica. É justo que seja assim. A elevação da escolaridade média da sociedade e o surgimento de uma nova classe média urbana de profissionais assalariados ajudou a potencializar novos sujeitos sociais que levantaram bandeiras político-culturais progressivas contra uma ordem mundial, até então, anacronicamente, reacionária.Entretanto, o maio francês foi, em primeiro lugar, uma inspiração para que na França e, pela sua repercussão, em todo o mundo mais urbanizado, ganhasse relevância político-social um novo movimento estudantil. Desde então, nem sempre a maioria dos estudantes se identificaram com o movimento estudantil. Nem todos os estudantes tiveram disposição para se colocar em movimento. Uma parcela mais privilegiada, ou mais iludida com as possibilidades de ascensão social, permaneceu à margem, ou foi diretamente hostil ao movimento estudantil. Não obstante, dependendo da relação de forças política mais geral na sociedade, e oscilando entre um movimento mais de vanguarda e ideológico em situações mais defensivas, e um movimento de massas em situações de crise política, os estudantes passaram a ser sujeitos políticos da maior importância. A história das revoluções é um campo de batalha ideológicaConservadores de todos os tempos, no entanto, asseguraram sempre que as coisas só mudam para permanecerem, essencialmente, iguais. As ideologias reacionárias admitem que o mundo pode passar por transformações, mas somente na longa duração. Não são inocentes: sabem que mudanças na longa duração não entusiasmam ninguém. Na longa duração estaremos todos com dores nas costas, senão diabéticos, ou pior, mortos. Não ignoram que as revoluções são processos que incendeiam a imaginação dos jovens, porque demonstram que as mudanças podem ser feitas.Os reacionários precisam denunciar os voluntarismos, mesmo quando admitem que são bem intencionados. Os mais esclarecidos podem reconhecer a legitimidade dos que lutam contra a exploração e a opressão, mas somente para desqualificá-los como sonhadores infantis. Consideram que todos os esforços de mudar a sociedade por métodos revolucionários estão condenados à partida. Apelam para os argumentos mais viciados: as recompensas seriam duvidosas, mas, certamente, não compensariam as seqüelas que toda luta traz; os sacrifícios seriam em vão. Não seria possível mudar o mundo, porque afinal as pessoas são como elas são; as relações sociais são como são, em função da natureza humana. A história, no entanto, tem a ambição de atribuir sentido ao passado, e não é casual que os historiadores marxistas tenham entre as suas preferências o estudo daqueles processos que desafiaram as forças de inércia que aprisionam as sociedades.Revoluções, portanto, sempre inspiraram batalhas ideológicas. O maio francês foi um ensaio geral de uma revolução. Foi um ensaio de uma revolução política ou democrática: a aliança entre trabalhadores e estudantes, que potencializou a greve geral e atraiu a simpatia de uma parcela das classes médias, esteve muito perto de derrubar o governo De Gaulle e o regime da V República (Hobsbawm, 1999). Remetendo a uma metáfora histórica, foi o ensaio de uma revolução de fevereiro.[4] Foi somente um ensaio porque a situação francesa foi bloqueada, ou controlada, e a queda de De Gaulle da presidência foi amortecida, apesar da greve geral. O 68 francês foi uma revolução de fevereiro abortada. De Gaulle acabou sendo sacrificado, depois que a vertigem da crise tinha sido superada, para preservar o gaullismo como principal partido do regime. Mas, mesmo sendo parcialmente derrotado, o maio francês demonstrou que a aliança operária-estudantil era o alicerce de um bloco de classes que podia desafiar um dos imperialismos mais poderosos do mundo.ConclusãoA disputa da memória foi o feijão com arroz das polêmicas historiográficas do século passado, porque a ordem político-social, em um mundo tão injusto e desigual, precisa de legitimação. A justificação do presente repousa na interpretação do passado. Não deveria nos surpreender que as revoluções, em especial aquelas nos países centrais, tenham sido, furiosamente, discutidas. A onda revolucionária de 68 teve três características novas: (a) a entrada em cena da juventude estudantil como detonador da mobilização operária e popular, ou seja, um papel protagonista como sujeito social; (b) a superação parcial, porém significativa, do domínio hegemônico que os partidos comunistas mantinham sobre as organizações dos trabalhadores; (c) a extensão internacional que a onda revolucionária alcançou, contagiando lutas em três continentes.Apesar de sua força, a onda revolucionária foi derrotada. A investigação histórica não deveria ignorar, no entanto, que existiram desenlaces alternativos em cada uma das encruzilhadas em que a revolução mundial mediu forças com a ordem do capital. Ao vencer, o capitalismo provou que era (ou estava) ainda forte o bastante para impor sua dominação, fosse pela força da repressão, ou pela negociação de reformas, ou por combinações variadas de coerção e cooptação. Isso não autoriza a conclusão de que a preservação do capitalismo teria sido a solução mais progressiva. Na história, a força não prova a superioridade. Na história das sociedades contemporâneas impuseram-se, mais de uma vez, soluções reacionárias, se a classe que poderia assumir o papel de sujeito revolucionário, por imaturidade objetiva ou debilidade subjetiva, não foi capaz de derrotar o regime capitalista. A caducidade do capitalismo, ou seja, sua permanência tardia ou senil introduziu elementos degenerativos nas relações sociais. O perigo da barbárie ficou maior.
PS: a foto que ilustra esse post é do ENE, Encontro Nacional dos Estudantes, em Minas Gerais, Julho de 2008. Acredito(tamos) que 1968 está voltando com toda a força...
• O governo entendeu o recado de Dantas. Se o dono do Opportunity resolver abrir a boca, muita gente sai queimada. De todos os partidos. O momento, portanto, é de colocar panos quentes na crise e deixar a poeira baixar. E o primeiro passo já foi dado.O delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz, responsável pelo inquérito contra o banqueiro Daniel Dantas, foi afastado do caso no último dia 14. Também foram afastados os delegados Carlos Eduardo Pelegrini e Karina Souza, que também atuavam no inquérito. O erro dos delegados: investigar e pedir a prisão do banqueiro. O anúncio do afastamento dos delegados ocorreu após uma reunião com a direção da Polícia Federal em São Paulo.Oficialmente, o governo e a PF afirmam que o delegado Protógenes se afastou para se dedicar a um curso em Brasília. Claro que ninguém acreditou. O ministro da Justiça, Tarso Genro, chegou a atentar contra a inteligência pública ao afirmar que não passava de “coincidência” o tal curso e a investigação contra Dantas. Após o habeas corpus concedido ao banqueiro pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, o afastamento dos delegados coordenado pela Polícia Federal e o governo desmascaram a tática para proteger Dantas.Jogando água Na noite do dia 15, Lula convocou uma reunião que contou com a presença de Tarso Genro, o funcionário de Dantas no STF, Gilmar Mendes e o ministro da Defesa, Nelson Jobim. Além de colocar “panos quentes” na suposta crise institucional entre o Judiciário e o Executivo após os desdobramentos da Operação Satiagraha, a reunião tratou sobre uma nova lei para coibir o chamado “abuso de autoridade”.Após a prisão de Dantas, Naji Nahas e Pitta, a ação escandalosa do STF na soltura do banqueiro e a revelação do envolvimento de políticos como o ex-deputado Greenhalgh, o problema para o governo e a Justiça são os “abusos” cometidos na prisão de criminosos de colarinho branco. Para o governo, na mesma semana em que a PM assassina uma criança nas ruas do Rio, e atira em uma vítima de seqüestro por engano, “abuso” de autoridade são algemas em banqueiros presos.Rabo presoA ação do governo e da Justiça tem uma explicação, porém, que não se restringe à questão ideológica de proteger os ricos. Tão logo Dantas foi preso, seu advogado Nélio Machado ameaçou divulgar “papéis” contra o PT. A ameaça não foi vazia e muitos têm motivos para se desesperar, já que o banqueiro foi o principal patrocinador do “valerioduto”. Dantas, aliás, é um verdadeiro arquivo ambulante das mais escabrosas falcatruas dos últimos anos, das privatizações de FHC ao mensalão. Muita gente tem razão para não querer que ele fique preso.
Diego Cruz http://www.pstu.org.br/

domingo, 20 de julho de 2008

Folha de SP, 08 de julho de 2008

Um débito colossal
FÁBIO KONDER COMPARATO
A escravidão de africanos e afrodescendentes no Brasil foi o crime coletivo de mais longa duração praticado nas Américas

A ESCRAVIDÃO de africanos e afrodescendentes no Brasil foi o crime coletivo de mais longa duração praticado nas Américas e um dos mais hediondos que a história registra.
Milhões de jovens foram capturados durante séculos na África e conduzidos com a corda no pescoço até os portos de embarque, onde eram batizados e recebiam, com ferro em brasa, a marca de seus respectivos proprietários. Essa carga humana era acumulada no porão de tumbeiros, com menos de um metro de altura.
Aqui desembarcados, os infelizes eram conduzidos a um mercado público, para serem arrematados em leilão. O preço individual de cada 'peça' dependia da largura dos punhos e dos tornozelos.
Nos domínios rurais, os negros, malnutridos, trabalhavam até 16 horas por dia, sob o chicote dos feitores. O tempo de vida do escravo brasileiro no eito nunca ultrapassou 12 anos, e a mortalidade sempre superou a natalidade; de onde o incentivo constante ao tráfico negreiro. Segundo as avaliações mais conservadoras, 3,5 milhões de africanos foram trazidos como cativos ao Brasil.
O seu enquadramento no trabalho rural fazia-se pela violência contínua. Daí a busca desesperada de libertação, pela fuga ou o suicídio. As punições faziam-se em público, geralmente pelo açoite. Era freqüente aplicar a um escravo até 300 chibatadas, quando o Código Criminal do império as limitava ao máximo de 50 por dia. Mas em caso de falta grave, os patrões não hesitavam em infligir mutilações: dedos decepados, dentes quebrados, seios furados.
Tudo isso sem contar o trauma irreversível da desculturação, pois todos os cativos eram brutalmente afastados de sua língua, de seus costumes e suas tradições. Desde o embarque na África, procurava-se agrupar indivíduos de etnias diferentes, falando línguas incompreensíveis uns para os outros. Para que pudessem se comunicar entre si, tinham que aprender a língua dos patrões, gritada pelos feitores. Foi esse, aliás, o principal fator de disseminação da 'última flor do Lácio' em todo o território nacional.
Outro efeito desse crime coletivo foi a geral desestruturaçã o dos laços familiares. As jovens escravas 'de dentro' serviam habitualmente para saciar o impulso sexual dos machos da casa grande, enquanto na senzala homens e mulheres viviam em alojamentos separados. O acasalamento entre escravos era tolerado para a reprodução, jamais para a constituição de uma família regular.
O resultado inevitável foi a superposição do direito de propriedade aos deveres de parentesco, mesmo sangüíneo. Há alguns anos, um pesquisador ianque encontrou, no 1º Cartório de Notas de Campinas (SP), uma escritura pública de 1869, pela qual um varão, ao se tornar maior de idade, decidiu alforriar a própria mãe, que recebera por herança de seu progenitor.
O fato é que, em 13 de maio de 1888, abolimos a escravidão tal como encerramos, quase um século depois, os horrores do regime militar: viramos simplesmente a página. Os senhores de escravos e seus descendentes não se sentiram minimamente responsáveis pelas conseqüências do crime nefando praticado durante quase quatro séculos.
Ora, essas conseqüências permanecem bem marcadas até hoje em nossos costumes, nossa mentalidade social e nas relações econômicas. Atualmente, negros e pardos representam mais de 70% dos 10% mais pobres de nossa população. No mercado de trabalho, com a mesma qualificação e escolaridade, eles recebem em média quase a metade do salário pago aos brancos, e as mulheres negras, até metade da remuneração dos trabalhadores negros. Em nossas cidades, mais de dois terços dos jovens assassinados entre 15 e 18 anos são negros.
Na USP, a maior universidade da América Latina, os alunos negros não ultrapassam 2%, e, dos 5.400 professores, menos de dez são negros. É vergonhoso que tenhamos esperado 120 anos para ensaiar a primeira medida de apoio oficial à população negra: a reserva de vagas para matrícula em estabelecimentos de ensino superior.
No entanto, tal medida representa hoje o cumprimento de um expresso dever constitucional. O artigo 3º da Constituição de 1988 declara, como objetivos fundamentais da República, 'erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais', bem como 'promover o bem de todos', sem preconceitos de qualquer espécie.
Mas o preconceito que tisna os brasileiros de origem africana não é neles marcado apenas fisicamente, como se fazia outrora com ferro em brasa. Ele aparece registrado como uma degradação social permanente em todos os levantamentos estatísticos.
Que as nossas classes dominantes tenham, enfim, a mínima hombridade de reconhecer que esse colossal passivo de nossa herança histórica ainda nem começou a ser pago!
FÁBIO KONDER COMPARATO , 71, é professor titular aposentado da Faculdade de Direito da USP e autor, entre outras obras, de 'Ética - Direito, Moral e Religião no Mundo Moderno' (Companhia das Letras).

"Eu sou um homem fechado. O mundo me tornou egoista e mau. E a minha poesia é um vício triste, Desesperado e solitário Que eu faço tudo por abafar. Mas tu apareceste com a tua boca fresca de madrugada, Com o teu passo leve, Com esses teus cabelos... E o homem taciturno ficou imóvel, sem compreender [nada, numa alegria atônita... A súbita, a dolorosa alegria de um espantalho inútil Aonde viessem pousar os passarinhos!"
M. Q.